Mas que tiuquetiuquetiuque...
Por que é que as pessoas fazem tiuquetiuquetiuque para os nenês? Nunca entendi isso. Não tem sentido fazer tiuquetiuquetiuque. Um adulto parece meio abobado agindo assim. Durante muito tempo, via alguém fazendo tiuquetiuquetiuque e imaginava o que o nenê devia estar pensando sobre aquela pessoa.
Então isso é um adulto?
É assim que vou ficar quando crescer?
Quero voltar para as trevas úmidas das entranhas da minha mãe!!!
Algumas mulheres não fazem tiuquetiuquetiuque, mas falam com o bebê como se fosse o bebê falando com elas, usando voz de falsete, miada:
- Aaaah, aguoooora eu quero cuooolo, não quieeero mais ficar nesse berço chaaaato...
- Devolve o meu biiiiico!
- Estou com fuome, mamããããe!
Isso sempre me irritou. Eu, agora, com o meu filho no colo, tento desenvolver um relacionamento digno com ele. Como sei que ele será desembargador, puxo conversas sisudas. Sobre a CPMF, a licença pedida pelo Renan Calheiros, essas coisas. Só que, dias atrás, aconteceu algo pelo qual não esperava. Trazia o Bernardo no colo, falávamos sobre a abordagem que o Cesare Cantu faz da Alta Idade Média, quando ele olhou bem para mim com aqueles olhões arregalados dele, e a boquinha dele foi se contraindo, e seus lábios se puxando para cima, e ele me lançou um sorrisão e, junto com o sorrisão, saiu da pequena garganta dele a maior gargalhada que ele deu até agora, uma gargalhada tão gostosa, tão sonora, tão limpa e doce, que sorri e fiz aaaah e, sem que percebesse, sem que pensasse nisso, sem que pudesse resistir, fiz:
- Tiuquetiuquetiuque...
E de novo, mexendo no queixinho dele:
- Tiuquetiuquetiuque...
E mais uma vez, beliscando-lhe as bochechas gordas:
- Tiuquetiuquetiuque...
É isso. Transformei-me num maldito fazedor de tiuquetiuquetiuques.
(Crônica de David Coimbra publicada no caderno Meu Filho, de Zero Hora)